quinta-feira, 31 de março de 2011

A raiva - abraçando o bebê


"Abrace a raiva com bastante ternura. Ela não é sua inimiga, ela é seu bebê. Ela é como seu estômago ou seu pulmão. Quando tem algum problema no pulmão ou no estômago, você não pensa em jogar o órgão fora. O mesmo acontece com relação à raiva. Você a aceita porque sabe que pode cuidar dela. Você é capaz de transformá-la em uma energia positiva. (...)

Você deve ser como a mãe que presta atenção ao choro do bebê. Se a mãe está trabalhando na cozinha e ouve o bebê chorar, ela pára qualquer coisa que esteja fazendo e corre para confortar o filho. Ela pode estar preparando uma ótima sopa, mas nada é mais importante do que o sofrimento do bebê. O surgimento da mãe no quarto do bebê é como a luz do sol, porque ela está repleta do calor do amor, do cuidado e da ternura. A primeira coisa que ela faz é pegar o bebê e abraçá-lo com carinho. Quando a mãe abraça o bebê, a sua energia penetra nele e o acalma. É exatamente isso que você precisa aprender a fazer quando a raiva começa a se manifestar. (...)

Ao abraçar conscientemente o bebê, a mãe descobre a causa do sofrimento dele e fica muito mais fácil para ela corrigir a sua situação. Se o bebê está com febre, ela lhe dará um remédio para baixar a febre. Se estiver com fome, ela o alimentará, e se a fralda estiver molhada, ela a trocará.

Como praticantes, é exatamente isso que fzemos. Abraçamos conscientemente nosso bebê - a raiva - para obtermos alívio. Continuamos a praticar a respiração consciente e o andar consciente, como uma canção de ninar para a nossa raiva. A energia da plena consciência penetra na energia da raiva, exatamente como a energia da mãe penetra na energia do bebê. Não existe nenhuma diferença. Se você souber sorrir, praticar a respiração consciente e a meditação, concentrando-se nos seus passos, é certo que sentirá alívio em cinco, dez ou quinze minutos."

(Trecho do livro Aprendendo a Lidar com a Raiva - Sabedoria para a Paz Interior, de Thich Nhat Hanh, Ed. Sextante, páginas 30 e 31)

sábado, 19 de março de 2011

O inimigo verdadeiro

"Shantideva diz que outros inimigos chegam e vão embora, mas o nosso maior inimigo, o inimigo verdadeiro, destrói nosso bem estar a cada dia. O seu nome é a centralização em si. (...)

Se a adversidade for examinada minuciosamente, descobriremos que ela não tem uma existência inerente. Ela aparece como adversidade devido à centralização em si. A centralização é que torna os nossos problemas maiores e faz os problemas dos outros parecerem insignificantes." 

(in Budismo Com Atitude - O Treinamento Tibetano da Mente em 7 Etapas, B. Alan Wallace, Ed. Nova Era, página 211)

sexta-feira, 18 de março de 2011

Trabalhar com a confusão

Detalhe da "roda da vida", o Buda.
 "Caros amigos,


Sentar em um centro em Salvador, em uma área muito barulhenta da cidade, parece muito diferente de sentar em uma rocha, olhando os montes e vales do Dipamkara. Porém, na realidade, não se trata da localização, mas de como podemos realmente ser de benefício aos outros.

Como podemos conduzir nossas vidas de modo a eliminarmos as condições que recriam a confusão e o sofrimento, não apenas para nós mesmos mas também para todos os seres? Trabalhar com a confusão é o caminho. Algumas vezes esquecemos, e pensamos que o caminho é sobre como, onde e quanto tempo estamos sentados, ou, talvez, como estamos vestidos quando sentados. Os mudras que conhecemos, o número de mantras que tenhamos feito, as iniciações tomadas. Os gurus que encontramos.

Eu sempre digo que não se percam na elaboração. É tão fácil fazer isso. Olhem para os elementos essenciais do caminho e mantenham-se nesse rumo. Portanto, o que são esses? Claro que nossa mente, já que ela é a fonte de todas as nossas experiências.

Nada acontece em nossa vida sem a interpretação da mente, isso está acontecendo a cada momento. Essa interpretação gera as subidas e descidas em nossa vida, dependendo se nossa idéia e interpretação das condições é boa ou má, e se acreditamos em nossa interpretação como a realidade da situação. Esse é modo como isso ocorre. Todos fazemos isso constantemente, perdendo-nos em nossas projeções, que é o significado de Samsara, o qual é o mecanismo de nossa psicologia do ego e suas projeções. Então, o que é o Nirvana? É enxergar a natureza dessas projeções, para que nossa visão não fique mais distorcida pelos nossos hábitos dualísticos de percepção. Nós podemos simplesmente repousar na verdadeira natureza dos fenômenos.

Então, apreciamos as constantes mudanças nas aparências, mas estamos liberados de nossos hábitos de reação e investimento naquelas aparências, dando a elas conteúdo e significado, ou qualquer substância, que, na verdade, de seu próprio lado, elas não têm. Quanto mais vemos a natureza vazia de nossas projeções, mais enxergamos a natureza vazia do self que as percebe. Lembre-se que, a fim de que exista um objeto, é necessário um sujeito que o perceba.  Se o sujeito não tem nada com o que jogar, qual o propósito de ter um sujeito ou percebedor? Isso é porque acreditamos em nossas projeções, de outro modo essa idéia de self não teria poder, sem resposta, sem referência, sem condições para essa ilusória e aparente existência.

Então, qual a diferença entre uma rua da cidade barulhenta e uma visão de montes e vales, já que ambas são apenas nossas projeções? Se a mente está agitada e confusa, então a forma que vemos aquele belo vale talvez esteja distante de ser tranquila. Enquanto, se nossa mente está calma e clara, aquela rua barulhenta talvez seja o mais calmo e pacífico lugar da terra – depende de você – a maravilha do caminho é que você começa a ver que pode escolher sua realidade, já que nada é fixo, nada é sólido, tudo é sua projeção e como ela é sua você pode trabalhar com ela.

Você não precisa ser uma vítima das circunstâncias mutáveis, você poderia ser um guerreiro que ressurge para os constantes desafios como um meio de aprofundar a própria compaixão e sabedoria. Como isso está expresso nos ensinamentos: a compaixão é a espontânea atividade da sabedoria. O que isso poderia significar? Que, quanto mais podemos estar mentalmente em descanso, sem nos perdermos em nossa fabricação mental, então, naturalmente, agiremos do espaço da consciência, nossa própria natureza de sabedoria. Enxergaremos todas as condições que os seres senscientes criam para aprisionar a si mesmos, através da infindável fabricação mental, e, também, veremos o caminho para eliminar a confusão.

O caminho é muito hábil, ele usa a fabricação mental para ir além dela mesma –  é importante saber o que estamos fazendo, e o porquê de estarmos fazendo isso. Então, supostamente, agora estamos usando a fabricação mental, de forma habilidosa, como o caminho. Em vez de constantemente nos perdermos, usaremos nossas tendências habituais para trabalhar para nós, e não nos impedir de ver  ou obscurecer nossa visão, mas habilitando-nos a ver como a fabricação mental funciona. De modo que, ao vermos a forma como o artifício trabalha para criar a ilusão, e uma vez que enxergamos isso, não mais estamos fascinados, e, então, não é necessário investir do mesmo jeito que faziamos, quando acreditávamos naquela aparência como algo tão real, tão verdadeiro. É a analogia do cinema: se você sabe que isso é um filme, você não investirá mentalmente do mesmo modo à medida que você percebe o que está realmente acontecendo.

Em algum lugar, no fundo de sua mente, você sabe que isso é apenas um filme, só uma ilusão. Desse modo, o jeito que você enxerga torna-se muito iluminado e mais divertido. Você não acha? Você tem uma escolha, se quiser acreditar nisso. Você também tem a possibilidade de se afastar, como se as coisas fossem reais, e, então, não existem meios de trabalhar com elas. Desculpe as divagações. Amor a todos, Ani Zamba"

(Mensagem enviada por Ani Zamba ao yahoogroups em 17.08.2005 )

Original em inglês:

A vida é a prática

Kwan Yin

“Caros amigos,

Quanto mais praticamos, mais vemos que a vida é a própria prática. O professor nos dá as ferramentas para utilizar as constantes oportunidades que nos são apresentadas à medida que surgem a cada momento. Poderíamos aceitar essas condições como uma oportunidade para perceber o verdadeiro aspecto dos fenômenos, se nossa motivação sincera é despertar totalmente nossa mente. Se este for o caso, como podemos ser excludentes?

Como sempre digo no começo de meus ensinamentos – nós não podemos experienciar nada na vida sem a mente interpretar isso de um certo modo – então isso significa que a mente é a fonte de toda experiência, não importa o quê. Logicamente, se você deseja compreender as causas e condições que produzem certos resultados psicológicos, então você tem que buscar as respostas em sua própria composição psicológica.

O caminho Budista enfatiza a importância do conhecimento experiencial, não apenas do conhecimento intelectual. É necessário ser honesto e retornar à maneira como vemos a vida - a forma como reagimos a certos fenômenos - nossa visão pessoal da vida, é com isso que estamos trabalhando – nossa percepção em constante mutação, que é condicionada por nossas projeções. Tudo o que experienciamos é trabalhável por não ter substancialidade. Tudo o que experienciamos não passa de nossa projeção de como os fenômenos se nos parecem, dependendo de certas condições. O caminho é entender os dois aspectos da assim chamada verdade - aquilo que nos parece ser de certa maneira, sob certas condições, e a realidade da verdadeira natureza dos fenômenos – não dependente de condições - por vezes denominados os aspectos relativo e definitivo da verdade.

A espiritualidade é a forma como você vê a vida, e não um dia, um momento ou certo lugar no qual praticamos certos rituais, ou sentamos em uma almofada numa determinada posição. A espiritualidade é o caminho do despertar, e a própria vida nos fornece o combustível para nossa prática. Se aproveitarmos a oportunidade para o despertar que se apresenta através da atenção plena e do vislumbre sobre a natureza dos fenômenos, esta será uma oportunidade que se nos apresentará a todo instante.

Que este Natal possa trazer para todos vocês a alegria da generosidade. Em Tibetano, generosidade é Jimba, que literalmente significa abrir-se, compartilhar, deixar ir - dar sem expectativas - não apenas necessidades materiais, mas dar sem temor, mostrando aos outros que eles não precisam manter uma mentalidade afligida pela percepção de privação, uma vez que somos em essência ricos - em nossa natureza nada nos falta - de forma que podemos nos dar ao luxo de dar e dar ainda mais. Dar o Dharma - o caminho para o despertar - que é o mais precioso dos presentes, porque através dele podemos eliminar todas as condições que produzem o sofrimento e a confusão em cada e em todo ser. 

Façamos deste Natal um tempo benéfico para todos. Com amor,  Ani Zamba”

(Mensagem enviada por Ani Zamba ao yahoogroups em 23.12.2004)

Texto original ( em inglês):

quarta-feira, 16 de março de 2011

Seu guru, sua natureza desperta

Guru Padmasambhava

Seu guru raiz é sua própria natureza desperta. Mas, a pessoa que introduz isso a você – que dá um vislumbre de sua própria consciência fundamental, de maneira que você tem uma conexão direta com sua natureza - essa pessoa é quem dá a oportunidade de enxergar isso. E, assim, não há mais dúvida sobre o que sua natureza poderia ou não ser. Esse é o guru raiz. Então, este é o significado de ter confiança na visão. Sua própria natureza é o autêntico guru; seu professor é o guru simbólico, que ajuda você a conectar-se ao guru autêntico. 

(Mensagem enviada ao grupo no yahoo em 20.12.2004)

Texto em Inglês:

terça-feira, 15 de março de 2011

Estamos sós

Retiro no Sítio Carababa

"Obrigado por escrever e partilhar seus sentimentos com nosso grupo. Estou certa de que muitas pessoas sentem-se assim também. Mesmo quando estamos cercados por pessoas ainda assim podemos nos sentir sós, e precisamos encarar isto porque, basicamente, é um elemento da verdade que não gostamos de ver.

Estamos sós, completamente sós em nossa própria singularidade. No sentido de que nascemos neste mundo sós, passamos pela jornada da vida sós, e morremos sós. Observando o sentido de nossa própria experiência de vida, ninguém mais pode vivenciar o que estamos passando pessoalmente; todos os altos e baixos da vida - não interessa o quanto se possa dizer sobre a dor que se está sentido, o sofrimento que talvez você esteja passando, a solidão ou a alegria que você sente, ninguém além de você conhece - é sua própria experiência, então você pode perceber que realmente estamos sós.

Precisamos assumir a responsabilidade por tudo aquilo que estamos atravessando, sabendo que é nossa própria  interpretação pessoal do que está ou não acontecendo que faz nossas experiências nos parecerem de uma forma específica em um dado momento. O pensamento budista nos ajuda a ver o mecanismo ou processo da mente que cria certas condições, que produzirão certos resultados. Uma vez que saibamos o que estamos fazendo, temos a escolha de continuar a fazê-lo ou parar; mas quando não sabemos o que estamos fazendo e que produz determinadas experiências, então nos sentimos aprisionados, não somos capazes de reconhecer o elemento trabalhável em cada experiência.

Precisamos continuar procurando até que enxerguemos a transitoriedade, a ausência de substância, a existência sem identidade própria de todos os fenômenos, tanto mentais quanto físicos. Então, estaremos livres dos hábitos que recriam as condições que produzem confusão e sofrimento. Somente assim veremos como nosso relacionamento atual com a vida é baseado apenas em confusão, que não há um 'eu' e que nunca houve um 'eu' para sentir-se só - tudo sempre foi uma ilusão. 
Mantenha-se praticando - Amor, Ani Zamba"

(Mensagem enviada ao grupo yahoo em 2006)


Original (em Inglês):